Com o passar dos anos o modelo familiar transformou-se e assim a sociedade conquistou novas formas de construir aquilo que pode ser entendido por família.
De fato. Um grande exemplo é a evolução do sistema jurídico acerca das definições, perigosas, mas definições sobre o que é família. O texto do código civil de 1916 definia a família conforme as suas aspirações políticas e sociais, representadas evidentemente pelo liberalismo burguês do século XIX. Várias falhas foram detectadas com o passar dos anos e assim as legislações foram se adaptando, como por exemplo, a legalização do divórcio na década de 70, esta fruto das revoluções culturais dos anos 60. Ainda, com o advento da Constituição Federal de 1988 a família não é mais entendida em consonância com o privatismo burguês do século XIX e seus efeitos começam a ser procurados em âmbito constitucional, buscando o interesse da sociedade pela efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana.
Podemos verificar também que as famílias monoparentais, comuns e não reconhecidas antes da constituição de 1988, são um grande exemplo dos avanços culturais do trágico, e ao mesmo tempo revolucionário, século XX. Nos dizeres de Eric Hobsbawn, O Breve Século XX.
Apesar das aparentes mudanças sociais ocorridas no século passado fomos pegos de surpresa por varias delas, inclusive pelo fato de paradigmas de racionalidade até então imutáveis, pôde-se verificar que estes eram incompletos e totalmente incompatíveis com o novo modelo cultural que surgiu neste período.
Em larga medida podemos verificar as falhas causadas pelo excesso de confiança nos revolucionários do século XVIII, pais do liberalismo burguês, e as heranças deixadas por estes em nossa cultura durante o século XX. A família, objeto deste estudo, é uma das principais instituições que recebem uma grande virada paradigmática e assim, torna-se alvo de muitas resistências dos grupos mais conservadores e por isso a necessidade de entrarmos num debate mais acirrado para colocar a família num plano de maior abertura e assim jogá-la de volta a vida[1].
Buscar uma nova forma de compreensão da família é fundamental, de modo que no século XX grandes mudanças sociais ocorreram e assim a família também passa a ser observada entre pessoas do mesmo sexo, ou nos dizeres de Maria Berenice Dias, as famílias homoafetivas.
Não se pode imaginar que esta noção de família é pacificada entre os doutrinadores do direito e, principalmente, entre os membros da sociedade brasileira. Buscar um paradigma de racionalidade novo e capaz de suprimir as incompreensões geradas pelo conservadorismo liberal burguês do século XIX, que ainda refletem em nossa sociedade, é o objetivo central desta pesquisa.
Pode-se verificar, e isto implica dizer, que todos enxergam que a família deixou de ser um “negócio”, onde as relações entre as pessoas se davam apenas para satisfazer às questões patrimoniais das partes envolvidas, observando-se, inclusive, o nome dado as partes, como por exemplo, os “consortes”, que pode ser definido como pessoas que comungam de questões patrimoniais. Preocupante mesmo é que ainda usamos este nome para designar pessoas em processo de casamento. Superada tal visão, a família, o casamento, ou seja lá a definição que se queira dar para um relacionamento, a formação de qualquer uma delas dá-se através do afeto entre duas pessoas, não importando efetivamente a orientação sexual entre os envolvidos e muito menos o patrimônio envolvido entre as partes.
Assim, mesmo que se enxergue que a família deixou de ser a formação de um negócio e passou a ser a concretização do afeto entre duas pessoas, podemos observar que existe uma grande herança, ainda hoje, em nossas relações de família no Direito, dos paradigmas liberais burgueses do século XIX. Superar tal visão é urgente.
[1] Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Disponível em: http://www.rodrigodacunha.com.br/artigos.html. Acesso em: 05/05/2010
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